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METAL DE CARNE E SANGUE

 Se você é um daqueles que já está de saco cheio  desse suposto "heavy metal moderno", chamado new metal e de seus abomináveis vocais limpos e saudáveis de boy bands; se você já não aguenta mais ver um dos gêneros musicais mais arrojados, subversivos e chocantes de todos os tempos afundar na lama da mediocridade e da burocracia musical, por meio de bandas de pseudo-heavy metal como Korn e Limp Bizkit; ou se você tem vontade de dar uma saraivada de .50 mm em um aparelho de som, toda vez que escuta emanar desse sonoridades insanamente legais, como trash metal e, até mesmo, a brutalidade sanguinária do death metal misturados com gêneros absolutamente antagônicos ao peso musical, tais como o hip-hop melódico e o techno pop, então, cara, continue a ler esta matéria e a banda sobre a qual essa discorre.
 Em 1984, é parido, na Suíça, o Celtic Frost, uma das bandas precursoras do black metal, que, por sua vez, é um dos sub-gêneros de metal extremo mais truculento, macabro e imune ao "politicamente correto" que já existiu.
 Diretamente influenciado pelas raízes mais primitivas e puras do heavy metal, como Black Sabbath, Judas Priest e Venon, o Celtic Frost, fazendo jus a estes seus antepassados macabros e satânicos, estréia com o disco Morbid Tales, que alguns críticos qualificaram como "o disco perfeito para você usar se quiser aterrorizar alguém".
 O Celtic Frost, em 1985, marca a ferro, a fogo e à sangue a sua marca na história do heavy metal com Emperors Return e To Mega Therion, trabalhos que imprimiram a banda o status de lenda da música extrema.
 Infelizmente, em 2008, o Celtic Frost foi para a sepultura, encerrando os seus trabalhos...contudo, um de seus pedaços originais, o demoníaco vocal/guitarrista Tom Warrior, ainda teimava em continuar respirando e vagando pela Terra para aterrorizar a nós, pobres mortais.
  Triptycon, a nova banda de Tom Warrior, formada por ele, também na Suíça, em 2008, e que lançou seu primeiro disco, intitulado Eparistera Daimones, em 2010, parece um Celtic Frost recém- ressussitado, um zumbi putrefato, porém transbordante de energia mórbida e faminto por carne e por medo humanos.
 Enquanto  bandas de metal moderninhas, como o Slipknot, parecem ter medo de irem até o fundo do poço do macabro e do lado escuro do ser humano, sempre aliviando o seu som através  da alternância de berros guturais com vocais limpos e, vez por outra, refreando a pegada death/black metal com ritmos mais pop e comerciais. o Triptykon, por sua vez, não tem medo de ser assustador, de ser um trem fantasma desgovernado de horror, que arrasta o ouvinte dos primeiros aos últimos segundos do disco, sem interrupções, as profundezas de um lamaçal de pavor gótico absoluto.
 Se a sonoridade do Slipknot, Korn, System of  a Down e outras da turminha do new metal trazem à lembrança do ouvinte cenas de recentes slashers holywdianos carentes de sangue e imaginação, que só assustam a filhinhos e filhinhas de papai, o Triptykon segue uma maré completamente oposta, indo buscar inpiração para as suas músicas nos realistas e perturbadores filmes de horror das décadas de 1980 e 1970, como O Exorcista, A Profecia, Hellraiser, Alien e as produções de cineastas como Dario Argento.
 Porém, são as imagens gélidas dos clássicos imortais da literatura fantástica gótica, como as obras de Poe, Stocker e Lovecraft que mais vão se entrelaçando como serpentes constritoras em nossos neurônios na medida em que vamos sendo empurrados pela compacta massa sonora (que parece uma parede de aço maçiço que despenca sobre nossas cabeças) das guitarras de Tom Warrior e V. Santura, em direção às entranhas dos mais genuínos black metal e doom funeral metal.
 Outro ponto (muito) a favor de Eparistera Daimones foi o uso de computadores e da tecnologia digital para tornarem as canções do disco ainda mais pesadas, sombrias e perturbadoras, algo que também vai ao contrário das bandas de metal moderno que, muitas vezes, usam sintetizadores e teclados para purificarem as suas músicas, tornando-as, assim, mais audíveis aos ouvidos sensíveis.
 Já os samplers, programados por Tom Warrior, nos lembram as coisas e as criaturas inomináveis que existem nas profundezas cósmicas e nas fossas abissais do inferno que H.P. Lovecraft descrevia nas mitologias complexas e enlouquecedoras de seus livros. Criaturas com anatomias tão disformes e tão psicodélicas que poderiam nos levar a insanidade total apenas se lhes for lançado um rápido vislumbre.
 Embrulhando toda essa carga de morbidez sonora, estão as vozes perversas de Warrior e Santura, que interpolam momentos de vocais mais rasgados com outros mais guturais ( nestas ocasiões, lembram um pouco a voz de Peter Murphy, do Bauhaus), e a capa do disco, uma verdadeira obra-prima do lúgubre e da devassidão, assinada pelo "Hieronymus Bosch" de nossos tempos e conterrâneo do Triptykon, H.R. Giger.
 Com a sua nova banda, Tom Warrior e seus colaboradores provam que bandas de heavy metal ainda podem provocar tanto calafrio na espinha quanto o primeiro disco do Black SabbathReign in Blood do Slayer. Mandam as bandinhas falcatruas de new metal para os quintos dos infernos e demonstram que, muitas vezes, o mais arrojado e moderno não está no presente, mas, sim, nas entranhas soturnas do passado.